A era dos biocombustíveis: a energia que vem do campo
Brasil possui uma das matrizes de transporte mais renováveis e sustentáveis do planeta, que são aposta para o futuro

O aumento do volume de biodiesel e etanol de milho é um dos desafios para o Brasil no contexto da Política Nacional de Biocombustíveis. Temos uma das matrizes de transporte mais renováveis e sustentáveis do planeta, e os biocombustíveis representam uma grande aposta para o futuro.
Com a escassez das fontes de petróleo, o óleo de soja – o mais produzido e usado na fabricação de biodiesel – e o óleo de palma começam a ganhar destaque no cenário de descarbonização do setor de transportes no Brasil. A palma, em particular, pode produzir até seis vezes mais óleo por hectare cultivado do que a soja.
No meu trabalho de pesquisa no MBA da Esalq-USP, investiguei os desafios que impedem o Brasil de se consolidar como líder na produção de biocombustíveis, com foco nas limitações relacionadas ao cultivo e processamento do óleo de palma. Constatei o enorme potencial do óleo de palma para a produção de biocombustíveis e a importância de desmistificar as associações do cultivo com desmatamento e trabalho escravo. Além disso, destaquei o papel das políticas públicas e privadas na exploração desse recurso, conhecido como “Pré-Sal Verde”.
Você pode estar se perguntando por que escolhi o óleo de palma. Como costumo dizer: o agronegócio está em praticamente tudo, até no combustível que colocamos em nossos veículos.
Cresci no interior de São Paulo, próximo a plantações de cana-de-açúcar, e sempre me fascinou a ideia de que aquela cana poderia virar combustível. Lembro-me, até hoje, de quando meu pai comprou um Chevrolet Monza, da General Motors, um sedan de duas portas, movido a álcool.

O etanol foi o primeiro biocombustível produzido no Brasil, graças ao Pró-Álcool, o Programa Nacional do Álcool, criado pelo decreto nº 79.953, de 14 de novembro de 1975. O programa incentivou a produção de etanol, e a indústria automobilística apostou em veículos movidos exclusivamente por esse combustível.
Em 1984, mais de 94% da frota era movida a álcool. No entanto, com a liberação das exportações de açúcar e a alta dos preços, o etanol tornou-se menos competitivo do que a gasolina. O lançamento dos veículos flex, em 2003, trouxe o etanol de volta ao cenário, mas ele não conseguiu reconquistar a preferência dos motoristas. Apesar de ser mais barato e sustentável, a gasolina ainda é preferida por sua maior eficiência.
Os biocombustíveis, derivados de biomassa, podem substituir os combustíveis fósseis. Sua matéria-prima orgânica é transformada em energia renovável, limpa e sustentável durante a queima.
Após o etanol, os óleos vegetais se destacaram como uma nova descoberta em 2004. Foi assim que surgiu o biodiesel, produzido a partir de óleos vegetais, animais ou resíduos oleosos, combinados com algum tipo de álcool.
No Brasil, o biodiesel é produzido, em grande parte, a partir do óleo de soja. Entre 2002 e 2013, a produção desse óleo cresceu 40%. O setor, que tem grande relevância no PIB nacional, representou 27% do resultado, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPEA). A produção de biodiesel nos próximos três anos é promissora e deve atingir a marca de 10 bilhões de litros.

No entanto, a Agência Internacional de Energia demonstrou preocupação com os altos custos de produção, questões relacionadas às safras e a possível escassez de matérias-primas.
Daniel Amaral, diretor de economia e assuntos regulatórios da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), destacou que o setor tem se esforçado para evidenciar as externalidades positivas do biodiesel para a sociedade, além de ressaltar sua qualidade como um combustível confiável. Ele acredita que políticas públicas podem fortalecer os biocombustíveis e aumentar sua participação na matriz energética nacional.
Uma das grandes apostas é o biocombustível feito com óleo de palma. Este tem rendimento até seis vezes superior ao da soja, balanço positivo na emissão de carbono, aproveita pastagens degradadas e ainda gera empregos.

A Elaeis guineensis Jacq, conhecida como palma, é originária do Golfo da Guiné, na África, e foi trazida ao Brasil pelos escravizados. Há registros iniciais da planta no Rio de Janeiro e na Bahia, mas foi na Amazônia, em áreas degradadas, que encontrou solo e clima ideais para se desenvolver. A palma é o único biocombustível com potencial para ser 100% carbono neutro.
O óleo de palma também ganha destaque em outras tecnologias, como os biocombustíveis de segunda geração (lignocelulose - E2G), o diesel verde, os combustíveis sustentáveis de aviação (SAF) e o hidrogênio de biomassa.

Milton Steagall, CEO do grupo Brasil BioFuels (BBF), disse que o Brasil possui um verdadeiro “Pré-Sal Verde” com o óleo de palma. Segundo ele, é possível usar esse recurso em setores como energia elétrica, química, biocombustíveis e agronegócio, evidenciando o potencial do país para liderar a produção global de óleo de palma. Contudo, é necessário trabalhar para desmistificar a associação do cultivo com desmatamento.
A Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) também apontou que o etanol de milho complementa o produzido a partir da cana-de-açúcar e que o diesel verde tem grande potencial, devido à sua baixa emissão de carbono.